sábado, 18 de junho de 2011

Um olhar sobre o bairro Otávio Bonfim a partir do processo de montagem de Além da Rua.


Registrarei algumas reflexões a respeito do vídeo Além da Rua, realizado nos meses de novembro e dezembro de 2010 por nós, alunos da Escola de Audiovisual de Fortaleza, no ateliê Imagem e Cidade. Sei que muito se pode dizer sobre este vídeo e ainda quero dizer, mas aqui irei me deter apenas a um ponto: meu olhar sobre o bairro onde foi gravado este vídeo.

Além da Rua foi gravado em um bairro de Fortaleza, chamado por muitos de Otávio Bonfim, com nome real nos mapas de Farias Brito. Já havia eu morado em bairros próximos como o Monte Castelo e o Jacarecanga, ou seja, sempre passava por lá e quando fazia isso me sentia um pouco 'apertada' devido ao estreito espaço entre as ruas e as moradias. Quando comecei a montar Além da Rua até hoje, passei (e passo) a ver este lugar de uma maneira diferente da qual eu via.

Lembro que Natália Viana (diretora de Além da Rua) pretendia primeiramente fazer do vídeo uma junção de documentário e ficção. Documentário, como um registro dos espaços peculiares deste bairro (como o Cine Nazaré de Seu Vavá, a bodega de Seu João -Abacate-, o bar do Zé Bezerra, a praça do Otávio Bonfim, etc) e como um registro do que estava ocorrendo naquele espaço. Devido às reformas em Fortaleza, seria destruída a Estação de Trem do Otávio Bonfim que antes era um muro entre as duas fileiras paralelas de casas. Destruíram a estação, consequentemente, destruíram as barreiras que separavam estas casas. A partir daí, houve uma interação maior entre esses habitantes. Porém, após essa 'destruição', seria (e ainda será) construída uma avenida que ligaria duas avenidas principais de Fortaleza (Avenida Bezerra de Menezes com Avenida Jovita Feitosa). Era exatamente esse momento de transição, entre a destruição da estação e a construção da nova avenida, que Natália queria registrar em seu vídeo, o momento em que esses habitantes ficariam frente a frente e teriam entre eles um amplo espaço livre. O vídeo também seria ficção, com uma história entre a relação de meninos do bairro com esses espaços peculiares e com esse novo espaço transitório.

Para quem não conhece o bairro Otávio Bonfim e assiste ao vídeo, não sabe que o descampado onde os meninos jogam bola e soltam pipa era os trilhos. E se não informado, não sabe que naquele lugar será construída uma avenida. Mas esse momento de transição está lá registrado no vídeo, não com palavras, mas com imagens, sons e sentimentos. Além da Rua acabou não destacando o antes e o que seria o depois daquele espaço, mas destacou algo que para mim é mais importante, a vida.

O processo de montagem desse curta desenvolveu em mim um sentimento de apego e carinho àquele bairro, mesmo não estando lá durante as gravações. Durante todo processo deprodução, por falha minha, só estive lá uma vez para uma reunião de equipe. Posso dizer que me sinto íntima de todas aquelas pessoas e de todos aqueles espaços do vídeo de tanto vê-los, revê-los, ouvi-los. É até incômodo pensar que se um dia eu for falar com algum daqueles garotos, nenhum vai saber quem sou. Sou estranha a eles, mas eles não são estranhos a mim. Enquanto, todo o resto da equipe é conhecida por eles, eu sou a única que não. O trabalho de um montador é tão solitário e ao mesmo tempo tão íntimo, sensível e rico! Hoje, passo pelo bairro, infelizmente ainda de passagem, e vejo aquele lugar com uma beleza incrível, sinto uma exaltação naquele/por aquele lugar que é tão simples e tão rico de vida. Não sei se essa exaltação surge em mim, por me espelhar naquelas crianças e enxergar minha infância nos bairros onde morei e que hoje não são os mesmos. Porém, percebo que a cada momento que passo por lá, algo muda. Até agora não mudou muita coisa, mas sei que logo irá mudar com as reformas. Nesse momento, nostalgia. É bom saber que nessa cidade grande ainda há resquícios de espaços parecidos com aqueles que estive durante minha infância, porém aos poucos são vítimas de uma mutação urbana. Espaços assim, cheios de vida - onde as pessoas conversam na calçada, brincam na rua, andam de bicicleta o tempo todo, estendem as roupas nos muros, vendem e compram algodão doce e pipoca -, são mutilados a cada dia nas grandes cidades. Estas vão se igualando cada vez mais e, por exemplo, chega um momento em que vamos para os Estados Unidos e nos sentimos em Fortaleza. Claro que o mundo não chegará a esse ponto de tudo ser igual, pelo menos eu espero que não, pois sem as diferenças típicas desses lugares que graça haverá em viajar, em conhecer novos lugares?

Esse meu sentimento pelo bairro Otávio Bonfim a partir de Além da Rua, me fez refletir sobre quando filmamos a cidade. Quando olho para o antigo leito ferroviário, hoje transformado em um longo areal, onde é improvisado como área de lazer para as crianças, como consta no Além da Rua, observo aquele lugar pelos enquadramentos do filme. É como se meu olhar fosse filtrado por um enquadramento invisível que está encrostado lá, como se a obra audiovisual tivesse o poder de confrontar dois olhares, o habitual e o sensível. Quando aquele areal se transformar em uma grande avenida cheia de transportes automotivos, poluindo aquele ambiente, tirando aquelas pessoas das calçadas, prendendo-as em casa, como será o meu olhar? Um olhar nostálgico? Creio que sim, pois este olhar sensível já está recebendo nostalgia ao ver aquele ambiente se modificar aos pouquinhos. Não posso ser romântica e dizer que devemos 'congelar' a cidade, creio que isso seja impossível, talvez seja bom para determinados locais (é... às vezes a mudança é necessária). A cidade é uma mutante, já a cidade da obra audiovisual, felizmente, não é. Reflito agora como é importante o ato de gravar/filmar a cidade, seja que bairro, que rua, que beco, que qualquer coisa for nesse campo semântico. Não precisa ser documentário para registrar a cidade. Seja qualquer tipo de obra audiovisual, visual ou sonora. Agora me veio um rápido pensamento quanto a obras/registros sonoros sobre nossa cidade, quase não se fala sobre. Ainda não pesquisei se há registros da paisagem sonora de Fortaleza mais antiga, sei que há da atual, inclusive nossos técnicos de som devem ter muitos sons ambientes da cidade por aí. Prometo pesquisar sobre. Voltando ao assunto, estamos tão conectados à cidade que não percebemos que aos poucos ela entra em mutação, percebemos mais isso quando viajamos, passamos um bom tempo no hospital ou temos algum problema que não saímos de casa, quando voltamos a vê-la, surpresa! Ela se metamorfoseou! Ela não, nós a metamorfoseamos. Nós criamos e recriamos a cidade. Digo nós aqui, não nós realizadores, mas nós seres humanos, nós todos, nós crianças, jovens, adultos, idosos, do sexo feminino e masculino, de todas as cores, de todas as raças, ou seja, todos os nós. Outra forma de perceber essa metamorfose da cidade é quando vemos uma obra audiovisual feita há muito tempo e a comparamos com a cidade do agora.

A obra audiovisual tem o poder de decupar a cidade, de expor para nós um olhar que antes não era percebido. Pode nos influenciar a ver a cidade de uma outra maneira, com uma carga de sentimento, seja este positivo, negativo ou a mistura desses. Antes, via aquele bairro com uma certa indiferença, agora não mais. Ao pegar o material bruto do curta, - ver, selecionar, rever, cortar, colar, recortar, costurar, montar, remontar- senti o bairro como se ele fosse um ser humano ali em minha frente na sala de edição, vi suas marcas; os vestígios deixados pelo tempo; suas rugas na terra, nas paredes das casas; sua pele seca; sua respiração naquelas roupas no varal e seu coração batendo ainda forte com aquelas pessoas trabalhando, brincando, cantando, dançando, passeando... vivendo.

Marina Mapurunga, montadora de Além da Rua
em Fortaleza, março de 2011.

domingo, 12 de junho de 2011

Vila das Artes: Filme "Além da rua" é selecionado para Mostra de O...

Vila das Artes: Filme "Além da rua" é selecionado para Mostra de O...: "O curta é uma produção de alunos do curso de Realização em Audiovisual da Vila das Artes O filme Além d..."

Trailers do Curta Metragem::: Além da Rua













Além da Rua
ficção, 20', HDV, Fortaleza-Brasil 

Sinopse
Após pegar escondido uma câmera fotográfica de seu pai, Leo e seus amigos brincam, vivenciando os espaços de Otávio Bonfim, bairro de classe média baixa de Fortaleza, onde mora, passeando pelos lugares por ele já conhecidos e descobrindo outros. 

Elenco
Cauã, Gabriel ,Leo ,Levi, Seu João, Seu Vavá, Seu Bené e Cesar Mota

EQUIPE

Direção e Roteiro
Natália Viana

Assistente de Direção
Elisa Ratts

Produção
Floriza Rios

Assistente de Produção 
Claudemyr Barata
Elisa Ratts

Fotografia
Leonardo Ferreira
Tiago Pedro

SteadyCam
Leandro Gomes

Arte
Raisa Christina

Som
Cesar Mota 
Júlio Figueroa 
Sarah Holanda

Montagem
Marina Mapurunga
Natália Viana

Desenho de Som
Marina Mapurunga



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